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Operação da Polícia Federal (PF) da manhã desta quarta-feira, 2, prendeu Walter Delgatti Neto, conhecido como o hacker da "Vaza Jato", e realizou buscas e apreensões em quatro endereços, incluindo o gabinete da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP). Os dois são investigados pela PF por uma suposta invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

Entre os dias 4 e 6 de janeiro deste ano, 11 alvarás de soltura foram indevidamente inseridos no Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP), plataforma administrada pelo CNJ. Também foi incluído um mandado de prisão falso para o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Delgatti é apontado como autor do ato.

Ele declarou à Polícia Federal e à Procuradoria-Geral da República que recebeu valores de Carla Zambelli para "ficar à disposição" e a relacionou como mandante e financiadora da invasão, o que motivou a operação desta quarta.

De acordo com Delgatti, Zambelli o procurou em setembro de 2022, durante a campanha eleitoral, para uma suposta "consultoria técnica", que acabou se desenrolando na trama investigada pela operação deflagrada nesta quarta-feira. O hacker disse que a parlamentar "queria que ele invadisse a urna eletrônica, ou qualquer sistema da Justiça, para demonstrar a fragilidade do sistema judicial pátrio". O encontro, segundo ele, foi em um posto de combustíveis na Rodovia Bandeirantes.

Ele confessou ter invadido o sistema do CNJ, como forma de demonstrar à deputada alguma vulnerabilidade nele. No depoimento, o hacker disse que, quando revelou para Zambelli a possibilidade de emitir um mandado de prisão para Alexandre de Moraes, ela "ficou empolgada" e escreveu o texto que constaria no documento falso. Delgatti disse à PF e à PGR que "fez algumas alterações, pois o português estava meio ruim, e emitiu o mandado de prisão e o bloqueio de valores".

O hacker afirmou no depoimento que recebeu, por transferências via Pix, R$ 13,5 mil de assessores da deputada. Foram, segundo o hacker, R$ 10,5 mil enviados por Renan César Silva Goulart, que atuaria como assistente parlamentar do deputado estadual de São Paulo Bruno Zambelli (PL), irmão de Carla e ex-secretário da parlamentar; e R$ 3 mil de Jean Hernani Guimarães Vilela, que atua como secretário parlamentar de Zambelli desde maio.

Em entrevista nesta quarta, após o início da operação, Zambelli respondeu que "não participaria de uma piada de mau gosto com Alexandre de Moraes", ao ser questionada sobre a suposta invasão ao sistema do CNJ. O ministro do STF autorizou as ações da PF.

"Eu sei o que pode acontecer com um deputado que brinca com um ministro do Supremo, haja vista Daniel Silveira, que está preso em Bangu", disse Zambelli.

Ela disse que "subcontratou" o hacker em novembro, depois das eleições, por R$ 3 mil, e alegou que o objetivo foi fazer reparos no site pessoal dela. "Eu não fraudaria as eleições para o Lula ganhar, e nem seria tão barato assim", afirmou a deputada

Relação entre Zambelli e Delgatti

Nas redes sociais, a deputada federal publicou em agosto uma foto de um encontro entre ela e o hacker no dia 28 de julho. "O homem que hackeou 200 autoridades, entre ministros do Executivo e do Judiciário brasileiro. Muita gente deve realmente ficar de cabelo em pé (os que têm) depois desse encontro fortuito. Em breve, novidades", escreveu Zambelli na ocasião.

Na entrevista nesta quarta, a parlamentar afirmou que conheceu Delgatti por acaso. "Um dia o conheci saindo de um hotel. Ele pediu meu telefone e eu dei", disse, sem informar detalhes do encontro.

Segundo ela, os dois se reuniram "duas ou três vezes" e, em uma dessas oportunidades, Delgatti teria ido a Brasília, custeado por Zambelli. "Ele disse que tinha provas e serviços a oferecer ao PL", afirmou.

Encontro com Bolsonaro

Na capital federal, ainda de acordo com Zambelli, o hacker se reuniu com Valdemar Costa Neto, presidente do PL, e com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O encontro, de acordo com a parlamentar, foi em agosto de 2022.

No depoimento à PF, Delgatti disse que o ex-presidente teria lhe questionado se "munido do código fonte, conseguiria invadir a urna eletrônica". O hacker não conseguiu entrar no sistema do Tribunal Superior Eleitoral.

Zambelli, na entrevista nesta quarta-feira, blindou Bolsonaro. "O presidente Bolsonaro absolutamente não teve nada a ver com isso", afirmou, sobre a contratação do hacker.

Quem é Walter Delgatti Neto?

Delgatti é ex-estudante de Direito e é chamado pela alcunha de "Vermelho". Ele ficou conhecido em 2019, por hackear mensagens trocadas entre Sérgio Moro (União Brasil-PR) e Deltan Dallagnol (Podemos-PR), que na época eram juiz e procurador da força-tarefa da Operação Lava Jato, e entregá-las ao jornalista Glen Greenwald.

Por causa do vazamento das mensagens entre Moro e Dallagnol, Delgatti foi preso em 2019. Ele conseguiu o direito de responder às acusações solto. Em junho deste ano, voltou para atrás das grades por descumprir uma das condicionais da liberdade e foi liberado novamente há quase um mês, no dia 10 de julho.

Quem são os outros envolvidos na operação?

Além de Carla Zambelli, o ministro Alexandre de Moraes apontou outros três alvos para busca e apreensão na operação. Dois deles são próximos da deputada: Renan César Silva Goulart e Jean Hernani Guimarães Vilela, servidores comissionados de seu próprio gabinete parlamentar e do gabinete de seu irmão, o deputado estadual Bruno Zambelli. Segundo a investigação, Goulart e Vilela teriam sido os responsáveis pelo envio de R$ 13 500 a Delgatti em pagamento por seus serviços.

Já o último investigado, Thiago Eliezer Martins Santos, é apontado por Delgatti como o autor da inserção dos alvarás de soltura falsos no Banco Nacional de Mandados de Prisão - Delgatti admitiu a autoria da ordem de prisão falsa contra Moraes, mas não dos alvarás de soltura. Santos é programador e foi preso na operação Spoofing deflagrada pela Polícia Federal em 2019 para investigar as invasões às contas de Telegram de autoridades e pessoas relacionadas à operação Lava Jato.

Publicado em Justiça

Em uma nova derrota da Operação Lava Jato, os ministros Ricardo Lewandowski, Kassio Nunes Marques e Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), votaram na tarde desta terça-feira (9) para manter a decisão que garantiu à defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva acesso à íntegra do material apreendido na Operação Spoofing - investigação que mirou grupo de hackers que invadiu celulares de autoridades, atingindo o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro e procuradores da força-tarefa da Lava Jato.

A Segunda Turma do STF iniciou nesta terça-feira (9) o julgamento de um recurso, apresentado por um grupo de sete procuradores da República, capitaneado pelo ex-coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, contra o compartilhamento das mensagens da "Vaza Jato". Para Lewandowski, Nunes Marques e Cármen Lúcia, o grupo não tem legitimidade para apresentar o recurso e contestar o compartilhamento das mensagens, o que caberia à Procuradoria-Geral da República (PGR).

"É extremamente grave e impactante o que veio à tona e que deve causar perplexidade em todos aqueles com o mínimo conhecimento do que seja o devido processo legal. Não estou entrando no mérito, apenas concedi a defesa que tivesse acesso a elementos de convicção que estavam em poder do Estado e que se encontravam no bojo de uma ação penal na qual os tais hackers foram condenados com base inclusive numa primeira perícia no material arrecadado", disse Lewandowski.

"Ademais, como se viu, a pequena amostra do material coligido até agora já se afigura apta a evidenciar, ao menos em tese, uma parceria indevida entre o órgão julgador e a acusação, além de trazer a lume tratativas internacionais, que ensejaram a presença de inúmeras autoridades estrangeiras em solo brasileiro, as quais, segundo consta, intervieram em investigações, aparentemente à revelia dos trâmites legais, de modo especial naquelas referentes à Odebrecht, objeto específico desta reclamação, com possível prejuízo ao reclamante", acrescentou o ministro.

O ministro Kassio Nunes Marques concordou com o colega, mas observou que não estava fazendo "qualquer juízo de mérito acerca da validade ou autenticidade" do material coletado na operação. "Limito-me, portanto, nos precisos termos do voto do ministro relator, a conferir acesso à defesa do reclamante ao referido material, permitindo, assim, o fiel cumprimento da decisão", ressaltou.


A ministra Cármen Lúcia foi na mesma linha. "Não me pronuncio sobre licitude, validade jurídica, sequer sobre a eficácia dos dados que se tem nessas comunicações", observou a ministra. "A Polícia tem acesso a dados, o Ministério Público tem acesso aos dados, e a defesa não tem acesso aos dados?"

Já o relator da Operação Lava Jato no STF, Edson Fachin, acolheu em parte o pedido dos procuradores de Curitiba, no sentido de impedir que Lula use as mensagens em qualquer ação judicial até uma posição do plenário do STF sobre a validade das provas. "O que se tem, para além da questão da legitimidade, é o exame do fornecimento integral do material apreendido na 10ª Vara de Brasília", frisou o ministro.

Durante o julgamento, Gilmar Mendes reforçou as críticas de que Moro atuou com parcialidade na investigação. "Já é possível depreender o funcionamento de uma certa combinação institucionalizada e permanente, a serem verdadeiras as mensagens, entre o juiz e os ex-membros da força tarefa da Operação Lava Jato. Isso tudo ressai dessas mensagens", afirmou


'Interesse'

Um grupo de sete procuradores entrou com recurso no Supremo contra a decisão do ministro que deu aval ao compartilhamento das mensagens da "Vaza Jato" com Lula. "O ex-presidente Lula não foi vítima (da Operação Spoofing), o aparelho dele não foi hackeado. A ele falta, no nosso entendimento, o interesse de ter acesso a esse material", disse o advogado Marcelo Knopfelmacher, que defende o grupo.

A defesa dos procuradores pediu ao STF que seja revogada a decisão de Lewandowski ou para que Lula seja obrigado a devolver as mensagens já obtidas. Também querem que o STF impeça o ex-presidente de usar o conteúdo da Vaza Jato "para qualquer finalidade que seja, inclusive defesas judiciais".


O objetivo da defesa de Lula é fazer um pente-fino nas mensagens para tentar reforçar as acusações de que o ex-juiz federal da Lava Jato o encarava como um "inimigo" ao condená-lo a nove anos e meio de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O resultado do julgamento de hoje, portanto, pode pavimentar o caminho para o ex-presidente da República reforçar as críticas à atuação de Moro na Operação Lava Jato e tentar derrubar, em outro julgamento, a condenação que lhe foi imposta no processo do triplex do Guarujá.

"No recesso, às vésperas do Natal, quando se requer apenas medidas de emergência, surge o advogado (de Lula) com petição pleiteando compartilhamento da Spoofing, dados esses que nada tinham a ver com a causa inicial da reclamação", criticou a subprocuradora-geral da República Cláudia Sampaio Marques, ao defender a derrubada da decisão de Lewandowski.

"O Ministério Público entende que o que aconteceu nesses autos é de extrema gravidade. Nunca vi uma situação dessa magnitude. O ex-presidente tem a seu controle materiais relativos a opositores políticos, que envolve dezenas de pessoas. A História julgará certamente o que está acontecendo nesses autos", acrescentou a subprocuradora.


Acesso

No mês passado, Lewandowski determinou que a 10ª Vara Federal Criminal do DF compartilhasse com a defesa de Lula, em um prazo de até dez dias, as mensagens que "lhe digam respeito, direta ou indiretamente", bem assim as que tenham relação com investigações e ações penais contra ele movidas na Justiça Federal de Curitiba ou "qualquer outra jurisdição".

Na decisão de dezembro, o ministro do Supremo indicou ainda que os arquivos da Spoofing somam cerca de 7 TB de memória, 'envolvendo inclusive terceiras pessoas'. Nessa linha, o magistrado reforçou na ocasião que os dados e informações relacionados a tais pessoas "deverão permanecer sob rigoroso sigilo".

A defesa de Lula, no entanto, alegou a Lewandowski que aquela decisão não foi integralmente cumprida, o que levou o ministro a ampliar o acesso do petista às informações obtidas na investigação.

"Não estamos tratando de conversas pessoais, familiares, entre amigos, mas de conversas entre agentes públicos que ocorreram em aparelhos funcionais e que dizem respeito a processos que correm na Justiça brasileira. Estamos falando aqui da prática de atos processuais clandestinos para esconder relações espúrias. Tudo acontecia fora dos canais oficiais", afirmou na sessão desta terça-feira o advogado Cristiano Zanin Martins, defensor de Lula

"Esse material não diz respeito à intimidade de nenhum procurador, diz respeito a um grande escândalo que está ocorrendo no sistema de Justiça do nosso País", acrescentou Martins.

 

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