Sábado, 02 Novembro 2024 | Login

Funcionários observam alarmados uma cratera formada na Estrada do Coqueiro Grande, em Fazenda Grande IV, nas primeiras horas da manhã dessa quinta-feira (2). Enquanto alguns acompanham a cena compenetrados, um fala ao telefone. O espanto não é à toa. Dois dias antes, na terça (28), os trabalhadores da Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa) estiveram no local para realizar o reparo da mesma tubulação de água. Já são cinco casos de rompimentos na rede de distribuição hídrica da capital em 18 dias.

Mais uma vez, a população foi quem sofreu os impactos do rompimento. Com a pista parcialmente bloqueada desde as 5 horas da manhã, o trânsito ficou congestionado ao longo do dia, de acordo com a Superintendência de Trânsito do Salvador (Transalvador). Apesar de o reparo nas tubulações ter sido feito mais cedo, a via só foi liberada às 16h, quando a repavimentação foi finalizada. O serviço completo durou cerca de 11 horas.

Para além das dificuldades de locomoção, moradores tiveram o abastecimento de água comprometido nos bairros Fazenda Grande III e IV. A partir das 14h, o serviço foi retomado de forma gradativa. É a segunda vez que as duas localidades enfrentam o problema na mesma semana. Na terça-feira (28), quando outra cratera foi aberta no bairro, um ônibus ficou no buraco aberto no solo, o que causou mais transtornos.

Para o engenheiro sanitarista Jonatas Sodré, membro do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia da Bahia (Crea-BA), os reparos devem ter sido mal realizados para que a tubulação fosse rompida novamente. “Acredito que o motivo tenha sido a qualidade de execução da obra. A tubulação rompeu, fizeram o serviço e ela rompeu de novo”, analisa.

Justificativa
Procurada, a Embasa justificou que apesar de a mesma tubulação ter sido rompida na terça-feira, o dano desta vez foi em outro trecho. A causa do vazamento teria sido o desgaste do material. Para corrigir o problema, a empresa diz que vai incluir a rede no planejamento de substituições.

Em entrevista ao CORREIO nesta semana, César Requião, superintendente de serviços da Embasa na Região Metropolitana de Salvador, elencou alguns fatores que contribuem para os danos. “Os vazamentos possuem várias causas. Podem ser decorrentes da fadiga do material, desgaste prematuro da tubulação, excesso de pressão interna. Além de fatores externos, como problemas com o terreno ou tráfego”, afirmou.

Má execução do serviço e falta de manutenção da rede também são fatores citados por engenheiros ouvidos pela reportagem. Apesar de ter sido divulgado que os últimos cinco casos de rompimentos em Salvador tenham sido de adutoras, o termo correto é rede de distribuição de água.

Isso porque as adutoras são tubulações maiores, que possuem vazão superior e estão localizadas majoritariamente na BR-324, de acordo com a Embasa. As redes de distribuição, menores, são as mais comuns dentro das cidades e levam a água tratada de reservatórios para as residências.

Rompimentos que danificam o solo e geram desperdício de água não são raros. A própria empresa admite que a média é de 30 vazamentos diários nos 7,8 mil quilômetros de extensão de rede entre Salvador e Região Metropolitana. César Requião e especialistas consideram a média satisfatória. De acordo com a Embasa, 100 equipes estão disponíveis para resolver as intercorrências como a que se repetiu em Fazenda Grande.

A Agência Reguladora de Saneamento Básico do Estado da Bahia (Agersa), responsável pela supervisão do serviço, informou que realiza fiscalizações ao longo do ano através de inspeções técnicas e análise de indicadores. Neste ano, a agência afirma ter fiscalizado 30 localidades de Salvador.

“Para as ocorrências inesperadas e que fogem ao padrão considerado de rotina, a Agersa fiscaliza a prontidão da prestadora em agir, a disponibilidade de equipes para a execução das ações corretivas, o tempo investido e a qualidade final do serviço, como aconteceu no caso da ocorrência do período do carnaval e as duas que a sucederam”, pontuou.

Reclamações
A reportagem questionou a Superintendência de Defesa do Consumidor na Bahia (Procon-BA) sobre o número de queixas relacionados a desabastecimento de água em decorrência de rompimentos na rede hídrica. Apesar de não ter tido retorno, sabe-se que a Embasa é, há cinco anos, líder de reclamações no órgão.

O último ranking divulgado pelo Procon-BA, no ano passado, apontou que a empresa recebeu 148 denúncias em 2021. Deste total, 96 não foram atendidas pela Embasa - o que representa uma taxa de 64%.

Os recentes rompimentos fizeram com que o Ministério Público (MP-BA) enviasse um ofício para diversos órgãos, além da empresa, cobrando explicações sobre o ocorrido. Na lista estão a Defesa Civil de Salvador (Codesal), Secretaria de Manutenção da Cidade (Seman) e a Transalvador. O MP-BA foi procurado para responder sobre os desdobramentos do caso, mas não retornou os questionamentos da reportagem.

Os transtornos na rede hídrica não são exclusividade da capital baiana. Também na terça-feira (2), o fornecimento de água foi interrompido em Senhor do Bonfim, Andorinha, Jaguari e Itiúba em decorrência de manutenção preventiva em trecho da adutora que atende os municípios através da Barragem de Ponto Novo. Segundo a Embasa, os serviços deveriam estar concluídos até às 18 horas.

Rompimentos viram meme nas redes sociais
Nada passa despercebido dos usuários das redes sociais. Qualquer caso peculiar pode virar piada se quem estiver por trás tiver criatividade e senso de humor apurado. No caso dos recentes rompimentos de tubulações em Salvador, houve espaço para memes e críticas. Confira alguns memes sobre os vazamentos que circularam nas redes.

Relembre os outros casos
A quinta-feira (16) de Carnaval em Salvador começou tumultuada com o rompimento de uma tubulação na Av. Reitor Miguel Calmon. Na ocasião, um carro foi engolido pelo asfalto, houve muito congestionamento e 16 bairros tiveram o abastecimento de água interrompido.

Dois dias depois, no sábado (18), outro rompimento aconteceu, dessa vez em Ondina. O fechamento da rede para a realização do reparo deixou a Av. Milton Santos desabastecida em algumas ruas transversais, além da Av. Anita Garibaldi e Paciência.

Outros dois casos aconteceram entre as 6 e 7 horas da manhã de terça(28), 12 dias após o rompimento da Miguel Calmon. Um deles na Estrada do Coqueiro Grande, em Fazenda Grande IV, onde um ônibus ficou preso quando o asfalto cedeu. O outro problema ocorreu na Av. Cardeal da Silva, na Federação.

Publicado em Bahia