Em um mês, Bahia cresce mais de 500% o número de registros de novos casos de covid-19. Segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) no intervalo entre 02 de novembro e 02 de dezembro foram registrados 55.374 novos casos da doença. Na comparação entre o primeiro e o último dia do período, o aumento foi de 505% com registros de 533 e 3228 casos, respectivamente.
Neste último mês, o dia com o maior número de novos casos foi o dia 28/11 que registrou 4.224 novos casos. 15 dias antes, a campanha eleitoral das eleições municipais entrava em suas últimas 24 horas provocando aglomerações por todo estado.
Em entrevista ao CORREIO, o secretário de saúde do estado da Bahia, Fábio Vilas-Boas já reconhece que o estado chegou à segunda onda de contaminação.
“Tecnicamente uma segunda onda acontece quando o número de novos casos é maior 50% em relação ao período anterior. Nós temos um número maior do que isso e de forma sustentada nas últimas três semanas. Nós estamos começando essa segunda onda e a expectativa é que ela seja apenas um reflexo do que aconteceu no período pré-eleitoral e que ela se extingua ao longo do próximo mês”, disse Vilas Boas.
Para o secretário, no entanto, existem fatores que tornam esse momento ainda mais preocupante do que aquele de meses atrás, apesar dos números absolutos não superarem os de meses como junho e julho.
“No começo da pandemia, a onda foi avançando da capital para o interior e tivemos regiões que iam evoluindo ao longo do tempo. À medida que uma região apresentava novos casos, outra ia melhorando. Nesse momento, estamos com o estado da Bahia inteiro em surto, com taxas de ocupação maiores do que 70% em todas as regiões, começando a pressionar a capital, enfrentando uma dificuldade de remanejar pacientes entre as regiões. Além disso, estamos com casos de internações não covid. No começo da pandemia tínhamos acidentes de trânsito reduzidos e agora temos um novo perfil epidemiológico que é a coexistência de causas de internação covid e não covid”, explica.
As aglomerações causadas pelo período eleitoral somadas às diversas flexibilizações ao isolamento que foram permitidas nos últimos meses é o que, segundo especialistas, pode estar por trás do aumento grande no número de contaminações.
“São muitos os fatores que podem estar por trás, desde as aglomerações que tem várias origens, festas, eventos, campanha eleitoral, das próprias casas das pessoas que começam a relaxar seus cuidados e fazerem encontros sociais com amigos e famílias. Nesses encontros, quando acontecem, as pessoas geralmente baixam a guarda, dificilmente um neto vai falar com uma avó usando máscara. Existe um imaginário de que em família não é preciso tomar maiores medidas”, alerta Angelo Loula, professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) pesquisador e cientista de dados do Portal Geovid-19.
Sistema de saúde
O novo cenário, já comece a refletir inclusive numa pressão maior no sistema de saúde, gerando dentre outras ações a reabertura de leitos desativados. Segundo as autoridades, no entanto, ainda não há que se falar em colapso. “Estamos preparando a rede para absorver esse volume aumentado de casos para que ninguém fique sem atendimento. Nesse momento, estamos reabrindo leitos que foram desativados dentro da própria rede estadual. Em Salvador, já foram reabertos leitos e já foi determinada a reabertura também em cidades como Porto Seguro e Juazeiro. Ainda é cedo para falar em risco de colapso, porque existem muitos leitos que podem ser reabertos ainda, se for necessário”, diz Vilas Boas.
Para os médicos que atuam diretamente no atendimento aos pacientes, nesse momento em que as pessoas estão com as medidas de isolamento mais flexibilizadas, a atenção aos cuidados individuais precisa ser ainda maior.
“Além da flexibilização que está acontecendo, das pessoas estarem saindo mais, elas não têm usado máscara corretamente, nem trocando a cada duas horas, deixaram de higienizar as mãos com frequência, de manter a distância mínima e tudo isso reflete no número de casos nos hospitais.. A doença é uma roleta russa e a gente não sabe como vai reagir e sabemos que agora, depois desse tempo todo, as pessoas estão tendo questões psicológicas sérias por conta do isolamento.
Então, é preciso intensificar esse tripé de proteção, da máscara, higienização e distância. É isso que nos protege e reduz riscos”, destaca o infectologista e professor universitário Claudilson Bastos.
A preocupação é ainda maior quando os números, segundo dizem os especialistas, não conseguem acompanhar a velocidade dos casos. É que existe um tempo entre o momento em que a pessoa sente os sintomas e colhe o material para ser testada e o dia em que o resultado fica pronto e é inserido no sistema entrando para os números.
“De certa forma, esses números então refletem o passado, o retrato exato dessa semana, por exemplo, a gente só consegue ver daqui um tempo. No fundo, no fundo, a gente não sabe exatamente qual é a real situação dessa pandemia. E ela pode estar pior do que os números mostram. Parte da população que está sendo contaminada fica assintomática, ou com sintomas leves, nunca vai ser testada, e a gente não vai ter a descoberta real desses números”, analisa Loula.
Fim de ano
O nova onda de casos chega em um momento de festas, caracterizado por algo que precisa ser evitado: as aglomerações. Os profissionais e autoridades alertam para a importância de evitar ao máximo as confraternizações em grupo. “As pessoas precisam se preparar para viver um Natal, um Réveillon, e um Verão muito diferente dos anos anteriores. Esse é um período que as pessoas frequentam mais as casas umas das outras e isso pode dar ainda mais gás para a taxa de transmissão. A recomendação é para as pessoas não viajarem, não irem às casas uns dos outros. Não vamos permitir Réveillon em ambientes fechados, em espaços com mais do que 200 pessoas, Vamos fazer o possível para não ter que fechar tudo de novo, mas se tiver que fazer, faremos. Não vai ter jeito”, diz Vilas Boas.
Se o encontro for inevitável, um alerta. “É preciso manter os cuidados, o distanciamento, uso das máscaras mesmo em situações com familiares e amigos, e que cada um se mantenha na sua bolha social só interagindo com as mesmas pessoas para evitar que haja a cadeia de transmissão”, finaliza Loula.